Cultura

LANÇADO NA LDM A "SAGA DOS SIRIO LIBANESES NO SUDOESTE DA BAHIA"

Evento reuniu famílias sírio-libanesas, jornalistas, autoridades e nomes da cultura baiana em uma noite de afeto e celebração ao resgate da herança árabe no sudeste do estado
Joseane Guedes , Salvador | 18/10/2025 às 17:38
LDM
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O cheiro do babaganoush se misturava ao das páginas recém-autografadas. Sobre uma mesa, pequenas tigelas de hummus, salada de feijão, muhammara e pão recebiam as mãos curiosas dos convidados, como se cada receita fosse uma lembrança. A noite de autógrafos de “A saga dos sírios e libaneses no sudeste da Bahia”, novo livro do jornalista, advogado e escritor Wilson Midlej, realizada nesta sexta-feira (17), na Livraria LDM do Shopping Bela Vista, começou antes mesmo da primeira palavra escrita: veio pelo olfato, pela memória, pelo cheiro de casa. O lançamento proporcionou uma experiência gastronômica para celebrar um trabalho que mistura apuro documental, narrativas de família e cuidado literário.

A saga é fruto de pesquisas iniciadas em 2019. Revisado com rigor técnico e documental, o livro percorre a trajetória de famílias como Hagge, Maron, Midlej, Salomão e Thiara, imigrantes do fim do século XIX e início do XX que se instalaram em municípios da microrregião do sudeste baiano, entre sertões, rios e pequenas cidades. Midlej não se limita a levantar fatos; busca contar “como” essas vidas se entrelaçaram com a terra, o trabalho e as tradições locais, as vitórias e os ruídos, os amores e as perdas.

O ambiente foi tomado por descendentes das famílias homenageadas, em uma grande reunião familiar. Em meio a abraços e risadas, o autor recebia o carinho de amigos, nomes da cultura e da imprensa baiana, além de autoridades e políticos como o ex-governador Paulo Ganem Souto, os ex-deputados federais Leur Lomanto e Roberto Britto, também ex-prefeito de Jequié (BA); e o desembargador Lidivaldo Brito.

O ex-governador Paulo Ganem Souto, também descendente de libaneses, falou sobre o impacto da obra. “Wilson presta um grande serviço à história da Bahia. Ele reconstrói o percurso dos imigrantes e mostra como eles se incorporaram definitivamente à nossa cultura. E, embora a minha família não seja retratada diretamente no livro, ele ajuda a entender a trajetória dessas pessoas que se estabeleceram em diversas regiões do estado, constituíram famílias e tiveram atividade econômica importante”, analisou.

“Mais do que uma fila de autógrafos, o que me emociona é ver aqui a densidade das pessoas. Cada uma delas carrega um pedaço dessa história. Este é o livro da minha vida. Ele não fala de mim, mas fala dos meus ancestrais. Foram cinco anos de pesquisa, viagens, escuta e emoção”, declarou Wilson, enquanto a voz tropeçava.

Ele destacou que a obra inclui receitas das famílias sírio-libanesas citadas, cuidadosamente resgatadas pela esposa, professora e pesquisadora Jussara Midlej, que aprendeu a cozinhar observando a avó do autor ainda na adolescência. “Minha avó não falava português. Jussara aprendeu só de olhar. Cada prato servido aqui, o quibe, o hummus, o babaganoush, o muhammara, é um pedacinho dessa convivência e da contribuição de amigos”, lembrou o autor.

Entre sabores e afetos

Na mesa dos petiscos, Jussara Midlej, que atuou como revisora técnica do livro, explicava a origem de cada receita. Aposentada da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (UESB), a educadora ofereceu todo o suporte para o nascimento da Saga. “É a oralidade que alimenta nossa memória”, disse ela, sorrindo enquanto pegava uma porção generosa de muhammara, feita com pimentão assado e nozes. Quem também auxiliou no brilhantismo do cardápio foi o chef Nelmaron. Doutor em Odontologia, ele levou o elogiado quibeh alsamak (quibe de peixe).

Foi Tânia Maria Fonseca Araújo, neta de José Habib Assis, uma das famílias citadas na obra, quem definiu o sentimento da noite: “Quando eu cheguei e senti o cheiro, logo pensei: ‘isso aqui é comida árabe’. É o cheiro da minha infância, da casa da minha mãe, da comida feita com as mãos da minha avó. Esse livro traz de volta tudo isso”, disse ela, emocionada.

O diretor da LDM, Primo Maldonado, fez as honras da casa e conduziu o início da sessão de autógrafos. Já o professor Sérgio Mattos, editor do livro e autor do prefácio, afirmou que a obra o obrigou a pensar fora do formato acadêmico. “Não se trata apenas de história. É história de vida, contada por quem entende de afeto. Tive que fazer um prefácio diferente, misturando pesquisa e emoção, como o próprio Wilson faz. Eu me senti honrado em fazer esse segundo prefácio para ele.”

A jornalista Suely Temporal, presidente da Associação Bahiana de Imprensa (ABI), esteve acompanhada por outros diretores da entidade, como o 1º vice-presidente Raimundo Marinho, Nelson Cadena e Luís Guilherme Pontes Tavares, e pelo historiador Pablo Sousa, assistente do Museu de Imprensa. Ela ressaltou o valor da obra para a memória coletiva. “O livro de Wilson Midlej nos ajuda a reconhecer a presença sírio-libanesa na formação cultural da Bahia. É história, é identidade e é também sabor. Ele conseguiu juntar tudo isso”, observou a dirigente.

O evento terminou com sabor, cheiros e lembranças impregnando o espaço como uma metáfora perfeita para o que o livro representa: a permanência do que se vive, mesmo quando tudo parece ter passado. A sessão foi prestigiada pelo jornalista Moacy Neves, 1º secretário da Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj); o jornalista e escritor Valber Carvalho, a historiadora Goia Midlej, as professoras Maria Lúcia, Sylvia Ganem Assmar e Elga Oliveira, a escritora italiana Antonella Rossili; o advogado, poeta e compositor Walter Queiroz Jr; Delson e Adélia Martins, o cardiologista José Alberto da Matta, Laércio Andrade, Alberto Sampaio, Gilberto Nery, Macdonald Assis, Nelson Cortes e José Alberto Cortes.

De repórter esportivo em 1969 a chefe de sucursal e editor, a trajetória profissional de Midlej é longa e diversa. Nascido na Ponta do Humaitá, em Salvador (4 de dezembro de 1945), estudou em escolas públicas e concluiu o bacharelado em Direito em Jequié (BA), cidade onde reside há 14 anos e preside o Instituto Pensar Jequié. Ele integra a Assembleia Geral da Associação Bahiana de Imprensa e já trabalhou em veículos como A Tarde e Correio da Bahia, dirigiu a extinta revista Bahia em Foco e assinou livros de crônicas, contos e um romance histórico antes deste volume. Entre suas obras já publicadas estão “Crônicas da Bahia sob o sol de Jequié” (2014), “Gatilhos de lembranças – A eternidade do tempo” (2015) e “Anésia Cauaçu – Lendas e histórias do sertão de Jequié” (2017).