Cultura

SALVADOR CAPITAL AFRO: UM TIRO NO PÉ, INEFICAZ - por TASSO FRANCO

Marca apenas politicamente correta no plano da reparação, mas no marketing global sem eficiência
Tasso Franco , Salvador | 03/11/2025 às 10:45
Vendedor de roupas na principal praia de Salvador
Foto: BJÁ
   A Prefeitura de Salvador insiste na marca Salvador capital Afro como sua identidade para se inserir no contexto das cidades mundiais. Em nossa opinião é um tiro no pé. 

Do ponto de vista político e da memória do colonialismo europeu tem até algum sentido e representa uma reparação. Mas, considerando que a África não é um país e sim com continente, e é a origem, a base da afican hereditariedade é muito mais viável uma pessoa – turista, empreendedor, estudioso, etc – ir a uma cidade da África do que a Salvador.

Salvador tem uma identidade que é a baiana – única no país – a música e suas belezas naturais. Então, seria mais oportuno do ponto de vista do marketing mundial situar Salvador como a cidade das baianas, cidade da música ou cidade da beleza natural do que Salvador capital afro.

  A pergunta: quem vai comprar essa Salvador capital Afro?

O mundo está globalizado e são 8 bilhões de humanos na terra sendo que 60% estão na Ásia, hoje o continente mais rico graças aos avanços do Japão, China, Coreia do Sul, Índia, Rússia, Cingapura, Malásia, etc. 

A China tem 1 bilhão e 300 milhões de pessoas e era um país de pobres. Se tornou um país de ricos e classe média consumidora. Quando 20% da população pula de patamar da classe C para B representa um total de 260 milhões de pessoas – mais do que a população do Brasil – que começa a consumir bens culturas (quer conhecer outros lugares, viaja) e de beleza – perfumes, bolsas, sapatos, etc. 

Em Paris – só um exemplo – há uma avenida chamada Montaigne um dos principais endereços da alta-costura e do luxo mundial. Localizada no Triângulo de Ouro, abriga grifes chanel, Dior, Prada, Louis Vuitton, e também o famoso hotel Plaza Athénée. 

Diariamente, na frente dessas lojas há filas de asiáticos – japoneses, chineses, indianos, sul-coreanos,  etc – comprando essas grifes. Paris foca seu negócio nesse mercado onde também vão brasileiros, argentinos, chilenos, africanos, americanos, canadenses, europeus, etc.

Outra coisa que Paris vende é a cultura dos museus e a religiosa. Na Basílica Sacre Croeur vai tanta gente, diariamente, que o turista no interior do templo religioso entra numa fila que não para e vai girando, as pessoas conhecendo o local andando. Na Notre Dame e no Louvre mais filas quilométricas. 

Salvador está fora desse mercado. Não recebemos grupos desses países, salvo pessoas isoladas. E, em tese, por oportuno, o que iriamos vender como capital Afro? 

Até os adereços do nosso Carnaval, a maior manifestação da cultural popular da cidade, veem da China. Até os colares dos Comanches.

Há um erro palmar da Prefeitura e de outros segmentos culturais da Bahia, inclusive de grupos afro baianos, em tratar a África como se fosse um país. 

 Ora, a África tem 55 países com falas em 2.000 dialetos, mas fala, basicamente, a língua dos colonizadores, salvo os árabes, Egito e outros. Predominam inglês, francês, português, espanhol e árabe as línguas oficiais.

  O mais populoso país da África é a Nigéria 235 milhões de habitantes e 500 dialetos se fala por lá, mas, a língua oficial é o inglês. A capital é Abuja e a metrópole, Lagos. A música destaque na Nigéria é o rock ou afro rock, afrobeat. 

  Você conhece algum rock nigeriano tocado em Salvador? 

O Senegal, outro país de grande visibilidade na África, a língua oficial é o francês. Em Dakar, a capital, fala-se alguns dialetos, mas, nas livrarias, nas escolas, na TV, etc, tudo é em francês. A música principal é o mbalax – mistura de funk, rock e reggae. 

A mesma pergunta: você conhece algum mbalax cantando em Salvador?

Então, como Salvador é a capital afro? O que vai se vender ao mundo como essa marca?

 Existem duas ou três Áfricas bem distintas: a árabe, cujo destaque é o Egito; e a negra; e a do deserto. O Egito e os países de cultura árabe centralizam seus esforços no marketing na cultura. 

 O Egito inaugurou recentemente um supermuseu de US$ 1 bilhão com 50 mil peças do antigo império faraônico.O Grande Museu Egípcio (GEM), um projeto monumental de US$ 1 bilhão foi erguido ao lado das Pirâmides de Gizé após mais de duas décadas de construção. Inaugurou no último sábado.

  A África negra tem nicho bem conhecido, divulgado, vendido e bem estruturado com grandes hotéis internacionais dando suporte que são os parques temáticos com animais selvagens. O Quénia é um exemplo, mas, existem outros em Botsuana, África do Sul, Congo, Mali, Senegal, etc. 

Salvo nos países árabes, as pessoas (de uma forma geral) vão a África pelos safaris, pelo exóticos, pelas girafas, pelos leões, rinocerontes, etc. E os países africanos vendem bem isso. 

Agora, pergunto, o que Salvador vai vender com o digito capital afro para o mundo? 

Não temos safari, não temos museus de gabaritos internacionais, não temos hotéis internacionais, nossa música perde feio hoje para o sertanejo e rock-doido de Belém, o carnaval estatizou, a violência campeia e nossa língua é o português. 

Politicamente, pode ser um digito, uma marca de reparação correta, mas do ponto de vista das relações internacionais de consumo da cultura e dos negócios, ineficaz.